Carlos Alberto Lopes

quinta-feira, junho 28

O CARROCEL

O carrossel girava sem parar e, montados nos cavalinhos de madeira, os meninos da favela se divertiam, fazendo de conta que eram mocinhos e bandidos, em perseguições intermináveis.
Havia três dias que o carrossel ali se instalava, no espaço entre o Auto posto do Mathias e o bar de seu Alfredo, local amplo, usado para o futebol diário daqueles que na favela viviam, sem diversão e sem luxo.
Fora obra de Mathias, a vinda do Carrossel, pois que o comprara já usado, de um parque de diversão que entrou em falências.
Como não havia perspectiva de aumento do Posto de Gasolina, pelo menos por enquanto, Mathias resolveu usar o terreno para o divertir dos pequenos, e assim a favela ganhou seu carrossel.
Tinha ele dez cavalinhos de madeira, em cores diversas, já começando a descascar a tinta.
Entre um cavalinho e outro, um pequeno banquinho, para as crianças menores.
Funcionava por intermédio de um amontoado de engrenagens, movidas por um motor elétrico, ligado por fios à tomada central do Auto Posto do Mathias.
Funcionou o Carrossel por quatro dias, sem problemas, levando alegria e diversão aqueles garotos sofridos e sem futuro.
Na manhã do quarto dia, um curto-circuito na instalação do Posto, provocou pequeno incêndio. Por sorte ninguém saiu ferido, e o fogo não atingiu a reserva de combustível, apenas danificou por completo a rede elétrica.
Sem a rede elétrica, além de não funcionar as bombas do Posto, não funcionava também o Carrossel, e isso deixou as crianças decepcionadas.
Mathias saiu, em busca de um eletricista e as crianças por sua vez, começaram a correr de porta em porta, procurando ajuda para que o Carrossel voltasse a girar.
Em pouco tempo a favela inteira estava envolvida.
A parte elétrica, foi substituída por dois motores usados de geladeira, os fios foram trocados por fiação nova, doada por José da Ajuda, dono da loja do Sopé do Morro, e já que era prá ajuda, os filhos da Maria do Morro e pintores de parede dos bons, se prontificaram a pintar os cavalinhos, já que estes já se descascaram.
Juntaram com os amigos, varias latas de tintas à óleo, de diversas cores, e se puseram na pintura, enquanto a parte elétrica era consertada.
Quando o Mathias chegou, ao final da tarde, com um eletricista, o Carrossel já estava todo pintado com cores brilhantes e o Auto posto também já funcionava a pleno vapor, pois as crianças também haviam conseguido uma caixa nova de força, presente de seu Melquito, dono da loja de materiais para a construção, que não só deu a caixa de força, como também mandou trocar toda a fiação do Auto Posto, coisa que o Mathias ameaçava fazer a anos.
Mathias, ao ver o Carrossel todo pintado de novo, e funcionando, e o Posto atendendo a freguesia sem problemas, sentou-se em um pequeno banco de madeira e deixou duas lágrimas banharem seu rosto.
Vendo-o emocionado, as crianças o rodearam, e um menino, o mais pequeno deles, disse ao já idoso comerciante:
_ Não chore, seu Mathias, pois nosso Carrossel está lindo de novo, e nós o amamos muito !
Foi ai que Mathias chorou de verdade, pois compreendeu que aquelas crianças, embora na humildade dos pobres, souberam reconhecer o presente do velho aos seus iguais, e tiveram fibra, para fazer a comunidade entender.
O Carrossel ainda lá está, girando como sempre, com a comunidade preservando-o.
Os filhos de Filó, dão mão de tinta nos cavalinhos periodicamente... Mathias já faleceu, mas em testamento, doou o terreno do Carrossel à comunidade, que o mantém como tributo ao seu benfeitor.

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